Mês: setembro 2019

Coquetel de Más Práticas

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Pela mídia, chega-me a notícia através da Pharmacy News (18 de junho de 2018) que um farmacêutico, mesmo identificando que uma formulação poderia causar danos e até mesmo risco de morte a um paciente, fez e vendeu o preparado. Seu argumento foi de que o médico insistiu que a formulação estava correta. O paciente de 77 anos morreu.

Esta ocorrência nos diz muito. Fato é que, diante de uma situação de risco, podem ser várias as reações que, por sua vez, poderão desenhar cenários dos mais diversos criando ambientes de sucesso ou de fracasso contundentes que arrasam reputações e causam prejuízos em todas as direções. Muitas vezes causam mortes de terceiros inocentes. Mais: muitos talvez já tenham morrido por decisões erradas e nem sequer tenhamos sabido.

Um dos aspectos interessantes, do ponto de vista, exclusivamente, da gestão da qualidade é a postura de passar para outro elo da cadeia decisória uma decisão a qual o indivíduo está plenamente habilitado para julgar e tem experiência de sobra para fazê-lo. Só não o faz por medo de possíveis represálias corporativas, por negligência ou irresponsabilidade. Nunca por desconhecimento.  Reforço que é exclusivamente apenas sob a ótica da gestão. Fizesse eu esta análise do ponto de vista ético, o assunto receberia outras cores mais densas.

Aí cabe uma pergunta: permitimos que os membros de nossa organização fiquem à vontade para decidir aquilo que é de seu conhecimento e de sua competência ou as questões das “ilhas de poder” se sobrepõem acima de tudo, arriscando a empresa e seus acionistas, em nome de grupos politicamente mais influentes? Onde existem “ilhas de poder”, “existem bunkers” e, o que é pior, existe um conjunto de tiranas leis, diferentes daquelas declaradas na missão da companhia.

Quando vemos a falta de atitudes corretas fazendo com que decisões sejam empurradas com a barriga para outro elo da cadeia, o diagnóstico mais apurado nos mostra que não é somente o indivíduo que está contaminado, mas todo o meio no qual ele transita, provavelmente. As ações corretivas e preventivas têm de considerar este aspecto.

Medo, negligência e irresponsabilidade podem estar juntos, ao mesmo tempo, em um verdadeiro e perigoso coquetel de más práticas.

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O trabalho “Coquetel de Más Práticas” de Carlos Santarem está licenciado com uma Licença Creative Commons – Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional.

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Andragogia Corporativa

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Andragogia é palavra originária do grego que significa “formação de adultos”. O norte-americano Malcolm Knowles a redefiniu como “arte e a ciência destinada a auxiliar os adultos a aprender e a compreender o processo de aprendizagem dos adultos“.

Carlos Santarem trata a Andragogia Corporativa como a chave da verdadeira motivação e do maior dos comprometimentos.


Alguns executivos iniciam seus programas, seus projetos e suas vendas sem antes considerar com profundidade quais benefícios todos os envolvidos obterão de forma pessoal e profissional. Em outras palavras, buscam ter sucesso em relacionamentos profissionais e até mesmo pessoais sem se preocupar, mostrar e assegurar as vantagens “para o outro”. O resultado é o fracasso que pode ser a curto ou médio prazo. Da mesma forma, é comum vermos apresentações de grandes projetos a grandes grupos de colaboradores apresentando como vantagens os ganhos futuros da empresa em moeda corrente ou em ganhos de fatias de mercado onde estes números são usados para buscar o comprometimento de todos, e usados para motivar os colaboradores a dar mais de si atingindo metas mais audaciosas.

Nesta linha, mesmo sendo extremamente vantajoso para a empresa, vantajoso para muitos dos seus gerentes e diretores e vantajoso para os seus clientes, os processos não funcionam porque “os outros não querem que funcionem”. Com isto, todo o investimento empregado em recursos financeiros, em recursos humanos e em recursos materiais é reduzido a pó pela falta de envolvimento e comprometimento “dos outros” que deveriam entender a importância do projeto. Fica evidente a falta de motivação “dos outros” que não se engajaram com a garra necessária para o sucesso do empreendimento.

Destacar os ganhos para a companhia é uma informação relevante para qualquer funcionário, mas serve apenas como uma das muitas informações que o adulto precisa para fazer suas avaliações antes de se comprometer em qualquer empreitada, antes de entender as vantagens dos treinamentos e muito antes de seguir seus líderes formais.

Raízes da andragogia são antigas. Grandes nomes ficaram conhecidos como excelentes mestres e verdadeiros líderes por dominarem esta metodologia que é, de fato, a única chave da verdadeira motivação de todos os indivíduos. Entre eles, destacam-se Sócrates, Platão e Jesus Cristo que souberam convencer seus aprendizes e liderados, ao mesmo tempo em que se mostraram humildes e capazes de serem questionados em seus conceitos todas as vezes que seus seguidores desejassem. Quanto mais se expunham, mais respostas mostravam ter e mais fortes ficavam. Sabiam responder a pergunta básica de todo o adulto antes do comprometimento maior: “O que eu ganho com isso?”.

Assim funciona a humanidade: movida a interesses. Cabe lembrar que o termo “interesse” não tem aí qualquer conotação pejorativa, uma vez que acumulamos em nossa história várias ações movidas a interesses altamente nobres. É desta forma que melhor entendemos a fé – onde encontramos o maior dos comprometimentos – e também entendemos os trabalhos voluntários. O indivíduo realmente se compromete quando ele entende que existem vantagens para si como pessoa e/ ou como profissional e isto é, na verdade mais pura, simples interesse.

Gerentes e outros líderes formais devem reconhecer na andragogia a melhor das ferramentas de motivação e empregá-la com sabedoria, buscando identificar os interesses dos seus colaboradores ao mesmo tempo em que atendê-los dentro da verdade da companhia. Não é simples e, muito menos, fácil; cobra do executivo maior dedicação a seus subordinados, bem como o força a melhor entender a pessoa humana, antes de vê-la como apenas mais um simples “soldado” de suas trincheiras. Não permite amadorismos e requer técnicas específicas para o pleno sucesso.

O mais difícil nesta tarefa está em identificar em cada indivíduo adulto de cada grupo que precisa ser motivado o conjunto de interesses desses indivíduos e desses grupos. Quais vantagens obterão os adultos que nos acompanham em nossas empreitadas ao se comprometerem de “corpo e alma” nos programas corporativos e nos treinamentos, por exemplo. Quando associamos bônus aos benefícios, ou qualquer outro tipo de remuneração especial, o convencimento fica extremamente facilitado, mas isto se aplica, na maioria das vezes, aos colaboradores das áreas de vendas, de marketing, e a determinados níveis hierárquicos, como gerentes e diretores. Isto não acontece em todo universo de colaboradores da empresa, e o exercício de buscar o comprometimento dos mesmos exige das lideranças um esforço maior, uma vez que a motivação de todos, sem exceção, é fator crítico de sucesso em muitos empreendimentos. Do contrário, podemos ver empresas investindo em treinamentos que não são refletidos na prática e obtendo retorno sobre tais investimentos aquém do desejado. Vemos programas da qualidade que se iniciam de maneira espetacular e acabam enfraquecendo e até desaparecendo com o tempo.

Gente adulta; esta é a palavra-chave. Os líderes devem conhecer a sua gente e as expectativas de vida do seu pessoal se quiserem contar com ele em todas as circunstâncias, inclusive as mais difíceis. Dedicar seu tempo, como gerente, em conhecer realmente seus liderados permitirá ao líder reconhecer um conjunto de interesses para motivá-los. AÍ está o que você, como líder, ganha com isso: cada colaborador adulto de cada equipe consciente que ao seguí-lo e às suas diretrizes, independente do grau de dificuldades, obterá vantagens que valerão todos os esforços. Este convencimento constrói exércitos de fiéis quase sempre imbatíveis.

Investir somente nos argumentos que mostrem as vantagens para a empresa fará com que o indivíduo pondere de outra forma e acabe criando um quadro próprio totalmente diferente. Pode o adulto identificar que a empreitada apenas o obrigará a trabalhar muito mais do que antes; que as possíveis horas-extras não compensarão os momentos que perderá com sua família e seus amigos; que o tempo que passará a mais na empresa o obrigará a deixar de participar de atividades que pratica normalmente, como uma academia e como um curso externo e até uma faculdade. Nestes casos, o adulto, de fato, reconhece um prejuízo que impacta na sua vida pessoal e no seu desenvolvimento profissional. O adulto não se motivará e, por esta razão, não se comprometerá.

Argumentos bem fundamentados na importância do tema, com o maior número possível de dados e de informação, com um painel claro das oportunidades e dos benefícios para a empresa e, principalmente, para os envolvidos montam um cenário adequado para o adulto fazer sua análise particular e, desta maneira, se entusiasmar. Andragogia corporativa: esta é a chave da verdadeira motivação e do maior dos comprometimentos.


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O trabalho “Andragogia Corporativa” de Carlos Santarem está licenciado com uma Licença Creative Commons – Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional.

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Eu preciso falar!

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15/09/2009

O relato imediato de possíveis interferências na qualidade.

Relatando as interferências de forma voluntária

Um sistema da qualidade realmente efetivo deve estimular seus colaboradores a comunicar às suas chefias imediatas, quaisquer situações de risco que possam interferir adversamente nos produtos ou na imagem da empresa. Isto de maneira voluntária.

Poderosos alarmes

Os relatos voluntários de tais eventos funcionam como poderosos alarmes. Operações interrompidas, em momentos exatos, por colaboradores dedicados e cautelosos podem evitar eventos de real perigo ou de evidente risco futuro para os consumidores, por exemplo.

Testemunho

Eu mesmo, como responsável de uma área de produção de comprimidos em uma indústria farmacêutica fui pessoalmente beneficiado com uma postura proativa de um colaborador que interrompeu o processo e buscou alertar-me, de imediato, a respeito de um caso de desvio da qualidade. Na ocasião, ele apontava para uma barrica aberta contendo uma matéria-prima a ser usada em um de nossos lotes. Na barrica, o conjunto de etiquetas indicava um conteúdo com todas as informações imprescindíveis para o seu uso. “Olhe, não é ela!” me disse, enfaticamente, o manipulador.

Eu que já havia reparado que a barrica estava íntegra e devidamente identificada, olhei para aquele pó. A cor, a granulometria e outras características que pude verificar com o meu olhar não garantiam que o meu funcionário estava com razão. Por outro lado, os registros das etiquetas diziam que o conteúdo da barrica era exatamente a matéria-prima que solicitamos para a produção do medicamento.

“Olhe, não é ela!” repetiu meu colaborador com sua experiência de décadas em fabricação de medicamentos. Sem alongar este texto com toda a conversa que mantive com o funcionário, decidi desprezar as etiquetas, suspender a fabricação e solicitar a intervenção do laboratório de controle da qualidade.

O laboratório constatou que o conteúdo da barrica não era aquele indicado na etiqueta! As investigações concluíram com evidências objetivas que as etiquetas foram trocadas na Central de Pesagem!

Um alarme no momento exato, evitou perdas para a empresa e evitou possíveis dores de cabeça futuras para mim!

As pressões internas

Fato é que, infelizmente, em algumas empresas existe um abismo entre o mundo das aspirações (e até mesmo da regulação) e o mundo real, onde o ato de alarme e relato dos colaboradores não é bem visto, quando as interferências que podem afetar na qualidade dos produtos são provocadas por descaso, omissão e até mesmo ação indevida dos próprios supervisores. Isto, em nome de argumentos como, por exemplo, o atendimento a vendas, o aumento da produtividade e o bater das metas; isto em detrimento das questões da qualidade. Assim é em Marte, Saturno e Vênus…

Em situações assim, existe o medo de represálias provocadas pelas chefias as quais podem literalmente infernizar a vida do funcionário. Existe o medo até de demissão… E nós sabemos que pressões desse tipo podem calar as pessoas.

Cabe a pergunta: Como os colaboradores inconformados com decisões que podem colocar em risco a qualidade de um produto, a reputação da empresa ou até mesmo a saúde do consumidor podem alertar para o risco ou até mesmo para um evento não conforme, sem sofrerem com suas atitudes proativas?

Não são poucas as vezes que muitos colaboradores chegam até certos profissionais da empresa (como aqueles da área da qualidade), de uma forma discreta e com um comportamento de temor, para relatar situações desse tipo. Acontece em auditorias, em treinamentos e até mesmo em situações informais como almoços e intervalos para o café na empresa. Têm esse comportamento com o intuito de poder contar com parceiros de confiança para se tentar evitar o mal maior.

As práticas condenadas

Pudéssemos nós mergulhar em um “mundo de fantasias” e elucubrar casos, apenas para dar cores fortes a quadros desse tipo, poderíamos dizer que mensagens dos colaboradores podem chegar alertando para o fato de que a liderança não usa luvas ou máscaras descartáveis em lugares nos quais tais acessórios de higiene são exigidos; as lideranças falseiam relatórios analíticos ou que matérias-primas vencidas podem vir a ser usadas (e assim já estão destinadas para esse fim) em lotes futuros.

Cenário irreal? É pelo menos um parágrafo de literatura de ficção que nos estimula a refletir sobre a gama de possibilidades as quais podem criar cenários de alto risco para a imagem da empresa e para o bem-estar e à saúde do consumidor.

A história de possibilidades de riscos mostra uma série de posturas perigosas já constatadas em muitas empresas, dos mais variados segmentos. Aí, se agrupam as atitudes impróprias de suborno e corrupção, se agrupam aquelas posturas que violam as normativas técnicas, bem como aquelas que violam o Código de conduta, entre outras.

O modelo do “Speak Up”

A instituição do mecanismo de “speak up” pode ajudar as empresas a receber os relatos dos colaboradores, ao mesmo tempo em que pode assegurar a eles um ambiente seguro para tais comunicações, sem qualquer risco de represália. Muitas empresas no mundo já adotam o “speak up”, entre elas as indústrias farmacêuticas. No Brasil já existem algumas, inclusive farmacêuticas também.

Convenhamos que tal preocupação poderia ser considerada como desnecessária, caso os ambientes corporativos fossem literalmente impregnados por atitudes pautadas na ética e, ao mesmo tempo, em uma moral expressa à luz dos cuidados com os consumidores e com a reputação da companhia.

Assim seja!

Fato é que, enquanto os ambientes não forem plenamente favoráveis para as Boas Práticas, o “Speak Up” será imprescindível para as empresas que prezam suas imagens e seus clientes. Assim seja!

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O trabalho “Eu preciso falar!” de Carlos Santarem está licenciado com uma Licença Creative Commons – Atribuição-NãoComercial 4.0 Internacional.

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