Corrupção, Ética & Sonhadores
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No próximo dia 2 de maio, os brasileiros poderão comemorar, ou melhor, dedicar parte do seu dia, para refletir sobre questões críticas pelas quais passa a humanidade e, especialmente, o país, no tocante aos assuntos da ética. Isto porque o dia 2 de maio é considerado o Dia Nacional da Ética.
Da minha parte, na verdade, deve ser mesmo uma data a ser comemorada, não pelo atual quadro nacional que ora está em nossa frente, mas pela teimosia obstinada de alguns sonhadores (será isso uma doença?) em sua cruzada por uma nação onde as relações de ordem política, corporativa e tantas outras de ordem social sejam pautadas à luz da ética.
Pessoalmente, e junto com cerca de setenta profissionais do país, de vários segmentos, estive envolvido com a elaboração da norma antissuborno, publicada pela ABNT. Estava lá, o Carlos Santarem, em várias reuniões, muitas delas na modalidade de web conferência, com outros tantos, de outros estados, debatendo sobre a norma, tomando ciência de como estava o andamento da elaboração da versão de cada país envolvido e vivendo sua participação em um momento no qual eu considerava muito importante para mim e para a minha empresa.
Ora, se não sou filósofo, tenho autoridade para falar sobre ética? Sim, cada um de nós, como animal social, não somente pode, como deve e tem de debater esse assunto!
Ora, se não sou advogado, tenho autoridade para falar sobre leis? Sim, e com todo o respeito aos meus queridos e imprescindíveis amigos do Direito, costumo dizer em meus cursos que “as leis, não são feitas por advogados, nem feitas para eles. As leis são feitas por cidadãos que nos representam e para todos os cidadãos, incluindo-se aí os advogados, farmacêuticos, jornalistas, engenheiros, aposentados, enfim, todos nós”.
Uma das posições que assumi na época de debates sobre a elaboração da norma foi a de defender um termo que, acredito, é mais importante do que o termo “ilegal”, quando tratamos de suborno. O termo de minha escolha é “delito”. Quem nos garantiria que, com o andar da carruagem, por lei, fosse determinado suborno, não o ato em si, mas um teto a ser considerado? O “legal”, historicamente, muitas vezes mostra-se verdadeiramente imoral.
Temos todos de falar de ética e, o que mais me impressionou na época, foi assistir dezenas de profissionais de várias organizações, privadas e estatais, vibrando como homens e mulheres apaixonados pelo tema e acreditando estar fazendo algo pela sociedade.
Infelizmente, um ponto em comum tinha de ser colocado logo no início das reuniões. Ponto esse que foi colocado em consenso entre todos os profissionais que estavam a elaborar a respectiva norma em todos os países onde vemos a ISO: a constatação de que nunca a sociedade poderia banir, de todo, a corrupção de nossos meios.
Assim, na elaboração da norma, iniciamos uma guerra a qual tínhamos (e temos) a consciência de que o inimigo não sucumbirá a nossos pés. O inimigo que circula, como um vírus, em nosso corpo, através de nossa corrente sanguínea, sempre encontrará um vaso de escape e uma célula para atacar e contaminar.
Loucura então a elaboração de uma norma assim? Uma norma sem caráter compulsório, sem força de lei que, ao invés de ser adotada pelas empresas e pelos governos pode ficar esquecida e empoeirada nas prateleiras da ABNT?
Sim, loucura! Loucura de sonhadores Dom Quixotes que não estão isolados, uma vez que esta teimosia pela ética é mesmo uma doença, mostrando-se, hoje em dia, extremamente contagiosa entre os brasileiros. Uma teimosia ética, na forma de anticorpos que poderão fazer com que o mal da corrupção possa ficar sob um controle razoável e, quem sabe amanhã, com a descoberta de um “novo remédio” (eu e a minha mania de farmacêutico) ser expelido pelos intestinos da sociedade.
Assim seja!
O trabalho “Corrupção, Ética & Sonhadores” de Carlos Santarem está licenciado com uma Licença Creative Commons – Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional.
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